quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Um dia de chuva



"Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol.
Ambos existem;
cada um como é. "

Alberto Caeiro

Fato: não aprecio um dia de chuva.
Constato:
De nada isso importa.
Meus gostos
e desejos pessoais
(até porque não sei os porquês de tal desconforto)
Nunca hão de mudar
As coisas do mundo.
Elas são como deveriam ser.
Obedecer  o tempo
E os ciclos.
O dia,  a noite , o sol, a chuva, os ventos e furacões
Não nos dão esse poder.
Essa é a realidade das coisas da natureza.
O sol não nos pergunta
Absolutamente nada
Simplesmente e excelsamente
Amanhece.
Faz-se luz.

O dia, a noite, o sol ,
a chuva, maremotos e furacões.
E tudo que nos rodeia
Nem se importam conosco,
os humanos.
Penso  que sabem da sua superioridade.
E da nossa humana insignificância.

Uma errata: "sabem da  minha insignificante presença"

Acerca do que eu comecei este assunto?
Ah, a chuva que não gosto.

Caeiro -  o Pessoa - é perfeito!
O dia de sol e o de chuva
São exatamente aquilo que são:
Belos .
(coloco aqui um adendo: cada um tem seu conceito de beleza)
Necessários e
Essenciais à nossa vida!
(isso não tem contestação)
Pois que tudo e todas as coisas deste mundo
Estão exatamente como deveriam ser

Atrevo-me aqui a afirmar que
Neste mundo,
Todos nós.
Os fenômenos e os viventes
Somos divinamente belos.

E o gato na janela?
Muito mais sábio que eu.
Apenas olha.
Enquanto eu penso.
Sobre coisas das quais
Nada posso mudar.

Amanhã vai chover.
Vou olhar, como o gato, a chuva
Pela janela.
E parar de pensar.
Ideias nada servem
Quando o assunto
É o dia , a noite, o sol, a chuva, maremotos e furacões.

O que vier, observo.
Me encanto.
Me protejo.
Ou me calo.

Maria Izabel Viégas

terça-feira, 29 de agosto de 2017

A certeza de ascender ao cume da minha montanha


"Se não fosse a certeza
Da imensa paz de descortinar,
Lá de cima, a planície,
Eu me sentaria agora à sombra
Daquele eucalipto,
E ficaria com os pássaros,
Com a tepidez da tarde,
Com o cheiro bom de mato
e cochilando... desistiria de caminhar."

(Prof. Hermógenes)

E me entregaria àquele cansaço de andar além
Ou desistir pois já tive o que mereci
Ou medo de sofrer mais
Ou o receio de, indo além,
Seguir num caminho desconhecido
Saindo da área de conforto
Que criei à minha volta.
Teria temor
pois já ultrapassei
de meio século
nestas paragens.
Seria mais confortável
Colher frutos das árvores que plantei.
Deitando-me à sombra
Cochilaria.
Sonhando que melhor ficar quieta
Com a clara visão do limitado
E lindo espaço que me cerca
Ou temer mais dores
e conflituosas travas
que já suporto
Ou superei.

Mas como assim?
Parar o tempo?
Viver do passado
Parando de sonhar?

E um dia acordar
E ver que simplesmente adormeci
Num berço tecido entre as flores.
Mas com limitada visão do ponto que me esqueci.
E ir desaparecendo, ficando ali
Virando relva, folhagem, adubo.
Voltar à terra
Sem ter visto o céu que me espera?

Não.
Tenho a certeza de que se seguir
Subir lá no cume
No topo das montanhas
Talvez a visão de minha história
Amplie, se descortine.
E ali entenderei
O porquê desta vida
E, talvez, quem sabe,
Minha visão de longo alcance
Encontrará o sentido desta vida
E de todas as vidas
Que me trouxeram a esta.

Com sapiência,
Posso atingir o ponto
Em que serei corpo translúcido
Estarei pronta para seguir
Tornar-me nuvem
E simplesmente,
Docemente,
Alegremente
Voar,
Partir!

Há uma montanha esperando por mim.
E nela tudo se descortina
Até a vida se renova em nova vida
Lá do alto serei o etéreo
Eterna.

Maria Izabel Viégas

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Chove





Chove


"Mas isso que importa! se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir a chuva que cai do céu
Uma melodia do silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?
Chove...
Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama."

 - José Gomes Ferreira -


Quando criança
a chuva me impregnava
de alegria.
Ela me arrastava,
ela um rio
eu sempre um barquinho
velas içadas seguindo
as imensas correntezas
que no meu imaginário
se formavam ali
no quintal da minha casa.
Criança, puro instinto
Criança, semente a eclodir
eclodia em prazer.
Renascia a cada temporal.

O tempo passa
a criança já perdeu o seu barquinho
ou escondeu-o num baú
do nem sei onde.
Tenho muitas
outras festanças
guardadas no baú de lembranças.
Tão escondido
que virou tesouro,
perdido
lá no bem distante.
Perdi a chave
Perdi, que pena!
Creio que ficaram nos meus olhos de criança.

Hoje, entretanto, a chuva não é a mesma
Ela não leva mais barquinhos
E sim arrasta casas, prédios, cidades
Arrasta o mundo
O mundo a fez ficar assim.
Pobre chuva.
Tornou-se ácida.

Sinto que os olhos da criança ainda moram comigo.
Há no meu peito um coração que clama:
Volta criança,
fala comigo
Mas escuta,
não só fala!

Sinto que o segredo,
a chave mestre
está no bater do meu coração.

Na próxima chuva
decodifico o código
e volto a brincar na chuva
a não temer
a confiar de novo
no poder criador
e purificador da chuva.

Posso até virar pétalas de flores.
Virar jardim.
E tornar-me 'una' com as águas do céu.
Quem sabe?


Maria Izabel Viégas



quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Memórias de Cruz e Sousa na minha vida.


INEFÁVEL
"Nada há que me domine e que me vença
Quando a minh'alma mudamente acorda...
Ela rebenta em flor, ela transborda
Nos alvoroços da emoção imensa.
Sou como um Réu de celestial Sentença,
Condenado do Amor, que se recorda
Do Amor e sempre no Silêncio borda
D'estrelas todo o céu em que erra e pensa.
Claros, meus olhos tornam-se mais claros
E tudo vejo dos encantos raros
E de outra mais serenas madrugadas!
Todas as vozes que procuro e chamo
Ouço-as dentro de mim, porque eu as amo
Na minh'alma volteando arrebatadas!"

O poeta:  João da Cruz e Sousa

Os porquês desse Encontro :
Entre eu, a adolescente, o poeta Cruz e Souza, e o símbolo da Escola Normal Carmela Dutra, do Rio de Janeiro,
aqui nessas minhas Memórias.

Inefável é tudo aquilo que nos causa imenso prazer, indescritível  por sua força, natureza e beleza.


Morava uma parte da minha infância numa rua chamada Cruz e Sousa. 
Meu pai me contou que era poeta e que lutou a a favor da Abolição dos escravos. 
Como é delicioso ter um pai que era sabedor de todas as coisas do mundo!
Quando fiz prova para a Escola Normal, naquele tempo em que o Concurso era difícil , uma seleção rigorosa onde o saber, o grau de conhecimento era o fator principal para a aprovação.
Não eram os tais "democráticos" nem os "politicamente correto",  os conceitos de hoje em que essa seleção é feita por grau de pobreza, idade e cor da pele.
Passamos todos, naquela primeira turma em que rapazes foram aceitos, e misturados estavam ricos, pobres, caucasianos, orientais, negros, italianos, portugueses e outros. 
Ninguém nos perguntava de onde vínhamos
e, sim, se tínhamos capacidade de aprender
e o conhecimento necessários para ali estudar.
No ano em que fiz o concurso meu pai faleceu e a vida ficou bem difícil,
financeiramente e claro, emocionalmente para mim,
a filha amada e que o amava tanto.
E mesmo assim, passei na primeira seleção. 
Passaram , dentre duas mil vagas, somente nós, seiscentos candidatos. 
Tiveram que abrir outro concurso para preencher as vagas restantes. 
Fui, para orgulho de minha mãe, na "primeira leva".

Bem, e o que Cruz de Sousa tem a ver com meu assunto?

Na prova de admissão de português a redação era 
analisar um poema de Cruz e Sousa.
Fiquei tão emocionada, me vi amparada pelos anjos.
Senti que era um sinal dos céus.
E assim o foi, pois tirei uma nota bem alta.
Foi indescritível, de natureza bela 
e que renovou em força e coragem de seguir à frente.

Nunca me lembrei da poesia selecionada, 
mas sei que me entreguei com alma, 
sentia que algum anjo me protegeu.
E assim o foi.
E assim o foi por todo o tempo em que fui profissional feliz e realizada
na minha profissão.

Trouxe aqui "Inefável"
pois é exatamente assim que me sinto.

A poesia me quedou apaixonada!

Quando minha alma desperta.
Quando em êxtase entro todos os dias, 
aqui de volta ao mundo após o sono.
Volto do plano imaterial do inconsciente, 
do plano espiritual para este nosso, 
o da limitada matéria,
até hoje, 
com minha alma desperta!
Sei que no sono encontro os meus amados,
viajo livremente para onde quiser 
pois não estou presa
neste plano dito físico
pelo ar pesado desse mundo 
saturado por tantas desavenças e contradições.

Volto, desse colóquio,
com minha alma já desperta e...

"Todas as vozes que procuro e chamo
Ouço-as dentro de mim,
 porque eu as amo
Na minh'alma volteando arrebatadas!"

E me encanto a cada dia com esse imensa dádiva da vida!

Maria Izabel Viégas


quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Refletindo sobre o poema de Neruda



Refletindo
sobre o poema
"Me Encante"
de Pablo Neruda



É preciso amar para ser amado,
é preciso olhar com doçura
para quem nos acalenta,  de tanto amor.
Simplesmente um raio de luz que de nós emana
e que alimenta a quem toca
e a nós retorna.
Quer ser amado?
Ama...assim docemente, suavemente,
Sem palavras ou cheio de colóquios.

Ama do teu jeito,
mas aprenda
que o modo do outro te amar
é o amor dele.

Se o amor do outro te encanta...
cultiva-o hoje, amanhã.
por todo o sempre.

E demonstre que queres ser adoçado...
adoçando.
O amor precisa ser sempre aquecido,
realimentado e alimentar- se de amor;

Tem que ser cuidado...
não exigido e sim, doado.

Pode ser um amor de um só...
mesmo assim é amor sentido...

Pode ser que ainda não veio...
esteja pronto para recebê-lo com um sorriso,

Mas, se forem duas almas que se encontram,
É o amor que adentrou seu coração
Talvez seja um amor antigo
ou de outras eras.
Agradeçam!
E juntos, celebrem e cantem!


Maria Izabel Viégas

Imagem: James R Eads
in Pinterest


terça-feira, 22 de agosto de 2017

Pela flor que morre, choro.


(meu belo boungaiville está morrendo)

 Despedir-se de uma flor
É humanamente triste.
Hão de zombar do que sinto.
Ora, com tantas dores no mundo,
Pessoas em guerra.
Fome. Doenças.
Gente sem teto.
Aquecimento global.
Governantes espúrios e políticos corruptos!
E vem aqui a chorar por flores?

Tonta.
Desumana.
Despolitizada.
Louca.

Não argumento nada em minha defesa.
Apenas lamento.
Choro igualmente pelos que não compreendem
A dor de ver morrer um pé de flor!
Estes nunca ouviram o sussurrar das pétalas
A me consolar
Quando sozinha
Pelas dores do mundo
Eu sofria.
E sofro.
Nem acordaram com o cantar de um pássaro 
Que ali construiu,
com extrema delicadeza
seu ninho.
Um ninho de louvor a vida neste planeta!

Não sorriu como eu
quando a brisa, que nos seus ramos rodopiavam
Saudando-me com um
Bom dia!
Nunca perceberam que foram minhas mãos
que a plantou e regou
Nem a viu vencer uma praga
Vendo-a reviver
Lutar
Reerguer-se
(como muitos humanos não sabem o como)
Na medida de um amor de flor
De cachos vermelhos
Que durante vinte e tantos anos
Encheram-me de alegria.
Fonte de elogios pela rubra beleza.
Envolveram meu ninho de amor,
Minha casa, meu lar
Protegendo-me dos estranhos com seus espinhos
Se assim o fosse necessário.
Uma cerca viva de verdejantes ramos e flores
Da cor do sangue que corre em minhas veias
E que fazem bater esse meu coração
Aqui dentro de meu peito.

Já perdi um ipê roxo elegante e sereno.
Agora estou me despedindo
De meu bougainville protetor,
Corajoso e majestosamente belo.

Sim.
Sou louca.

Louca de amor
por cada flor que tenho.
Louca de amor por aves
Apaixonada por meus cães pastores.
Sou um ser estranho.
Prefiro mais bicho e flores do que gente.

Que pena tenho de mim.
De ti, minha flor, terei saudade.
Sempre é doloroso
Dar adeus a quem ou a algo que amamos.
E que se vão mesmo contra vontade,
Pois é o término inevitável do ciclo de sua vida.

Maria Izabel Viégas

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Autora em desassunto

Hoje volto ao blogue,
relembrando Mario Quintana:

" Um autor, primeiro, é assunto.
Mas a glória mesmo, é quando ele vira falta de assunto."

Preciso definir alguns pontos:
Sobre o autor.
Aqui não está um autor.
Aqui quem escreve é um impostor.
Feminino -  uma impostora.
Ousando refletir sobre algo
que nem tem mínima ideia
do que seja.
Ela, a impostora,  então, inventará.
Logo, além de impostora,
Ser inventora - a definirá?
Inventando que sua falta de assunto
Encantará seus ouvintes.
Na certeza, que ninguém a ouvirá.
Logo, além de impostora, e inventora,
Mente - é mentirosa?

Penso , pois a conheço muito bem
Que ela esconde algo.
O seu real assunto:
Expor sua opinião
Sobre a "perplexidade
Desses"assuntos"
(deploráveis) que são notícias:
"Aqueles que despertam o gozo das multidões:
Esse prazer mórbido pela miséria do mundo.
O desumano prazer desmedido pela desgraça
O encantamento por assuntos fúteis e vazios."

Vou acrescentar mais um ponto:
Além de não se autora, impostora e mentirosa,
É extremamente presunçosa.
Lógico!
Como se atreve a julgar aqueles
ouvintes inexistentes que nem sonham que ela exista?
E que têm direito de ouvir outros assuntos
de outros autores que se assumem como tal
e são reais?

E eu, aqui, me divirto
Ela conseguiu redigir (até agora)
Trinta e oito linhas
sobre exatamente nada!

* O seu "sem assunto", meu "desassunto" é realmente encantador, meu nobre Mario Quintana!

Maria Izabel Viégas

O Renasço Ocaso começou aqui: Quer ler? Vou gostar!

Sou por acaso o ocaso

Se sou ocaso Serei o fim Do sonho de estar  em vida? Ou serei Um sonho de transformar-me No sono daquilo que Se agiganta E me...